terça-feira, agosto 28, 2007

Journal I


Naquele dia no bar, eles não foram de encontro marcado. Entre amigos chegaram, entre eles ficaram e assim se reconheceram.

Sentada, delicada, junto ao balcão, ela sorria segurando sua água mineral. Ele se sentou ao seu lado, pediu uma vodka importada e decidiu naquela hora se abrir, mostrar seu lado nu, aquela verdade de sentir que seus poemas guardados delatavam pelas frestas. Era hora de falar, de se entregar sem ameaças, de romper a máscara do homem bruto, para transparecer a sensibilidade outrora escondia.

Ela, num regozijo de espanto, insistiu ser surpreendente desejá-la daquela maneira. Abriu seu caderno vermelho, dizendo que um dia o amor imperfeito tocara seu coração. Leu algumas palavras, poemas doces de uma mulher apaixonada que alguém não mereceu.

O homem suspirou por dentro, como se fosse uma chance de chegar e habitar seu mundo sozinho.

Ela se encantou. Tudo aquilo era cinematográfico. Um dom da noite, todo aquele acontecer. Tudo parecia ter um “quê” de efeito especial. Começou a se despetalar em lembranças, parando o tempo, assim, num de repente.

Ambos tropeçavam em sensações. Sem se tocar, ele não via lábios, só sentia o beijo. Ela, olhando seus olhos, o abraçava por dentro. A música alta, era como se não tocasse ali. Havia um silêncio de confissão entre eles, só suas vozes se propagavam naquele espaço.

Foi aí que tudo aconteceu. Ela sorriu aquele sorriso que só as mulheres têm, aquele que fala, que diz tudo, mas que normalmente não se entende nada. Arrumou seu cabelo com uma nota de sensualidade e singeleza, espalhando seu perfume amadeirado pelo resto do ar que não cheirava a cigarro.

Ele, sentindo um calafrio em cada veia, respirou aquilo tudo, ajeitou-se no balcão e aconteceu. A vodka arranhou a garganta quando num olhar de culpa ela se fez entender: sorrindo, baixou os olhos, beijou o rosto dele e se despediu olhando para trás.

Foi um momento mágico. Entre confissões e idéias abusadas tudo ficou como estava. Ele vestiu sua dignidade, tomou mais um gole e riu de si mesmo, como era a praxe para os corações quebrados da noite.

E ela, foi dançar a dança da solidão com mais um amor guardado no bolso, nas páginas de seu caderno vermelho.

Ele ainda teve tempo para uma reflexão, lembrando as palavras de Guadalupe: “No momento do NÂO, o que sempre acreditamos ser um câncer de cotovelo, sete dias depois, não passa de um “ tumorzinho” benigno capaz de ser extirpado com um simples cortador de unhas, enquanto cortamos as unhas dos pés e refletimos sobre os mistérios da patologia do amor.”